Os aplicativos abutres – plataformas digitais que se vendem nas mídias sociais como facilitadores para a resolução de conflitos entre consumidores e empresas – oferecem oportunidades falsas e obscuras de angariar lucro.
A pandemia de Covid-19 trouxe vários tipos de problemas, em todos os setores da nossa economia, que afetaram profundamente o funcionamento e a atuação de empresas e serviços diversos.
A questão econômica, por exemplo, foi enormemente afetada por toda essa crise, em vários quesitos. E o declive da economia continua intenso, mesmo com esforços progressivos de estabilizar a situação.
Além de prejudicar de forma clara a economia do país, a pandemia também trouxe diversas questões problemáticas de consumidores que tiveram alguns de seus direitos violados de uma forma ou de outra, como reflexo dessa situação imprevisível que estamos vivendo.
Sendo assim, começamos a encarar um painel novo e muito terrível, onde uma grande quantidade de conflitos entre empresas e clientes tomou proporções enormes.
As companhias aéreas representam uma boa parte do PIB do nosso país, e isso é um fato conhecido. Aproximadamente 2% do valor desse produto interno, se deve a elas.
No entanto, com diversos problemas envolvendo cancelamentos, atrasos e suspensão de diversos voos nacionais e internacionais por conta da atual pandemia, não houve como impedir a enorme onda de processos judiciais que acabaram chegando ao nosso sistema de justiça.
E os aplicativos abutres, que prometem vantagens e facilidades para quem quer resolver judicialmente essas causas, acabaram por encabeçar essa massa de ações que adentraram o judiciário.
O que são e como agem esses aplicativos?
Esses aplicativos abutres viram na pandemia do Covid-19 uma oportunidade obscura de angariar lucros, por meio da incitação a uma judicialização em massa de causas referentes a problemas de voos nesse que ocorreram nesse período.
Basicamente, esse tipo de aplicativo tem uma propaganda forte – importante frisar que esse tipo de divulgação é vedado pela OAB – que acaba por encorajar os clientes que tiveram problemas com empresas aéreas, a moverem ações judiciais, por meio da consultoria deles.
Essas questões poderiam sim ser resolvidas por meio de contato direto com a empresa em questão, por intermédio do próprio relacionamento interno da empresa, sem a necessidade de partir para esses termos.
No entanto, os aplicativos abutres incitam os consumidores ávidos por respostas e garantem a solução dos problemas por uma forma “fácil”.
Com uma maliciosa esperteza, essas empresas agem de forma cruel: compram os direitos de crédito do consumidor por um valor ínfimo, garantindo que a indenização recebida não vá para quem de direito, lucrando em cima da pessoa que confiou a resolução da demanda a esse aplicativo.
O grande problema relacionado aos aplicativos abutres está em lotar de forma massiva o sistema judicial, aproveitando-se da ausência de custas para esses tipos de ações, e fomentando essas causas sem nem ao menos incentivar que o consumidor faça prévio contato com a empresa e resolva o problema fora do judiciário.
De forma preocupante, essas chamadas civic techs, são verdadeiros oportunistas e garimpam consumidores inflamados, alimentam o ódio pelas empresas e ainda por cima ganham com as indenizações, oferecendo promessas de “lucro” rápido para quem contrata seus serviços, oferecendo valores pequenos para a compra da futura indenização.
Por meio de uma pesquisa, foi comprovado que aproximadamente 20% dos processos judiciais no ano de 2019 tenham sido feitos por meio desses aplicativos, deixando claro sua força negativa e peso na máquina do judiciário brasileiro.
O que está sendo feito para acabar com o problema das civic techs
Para tentar conter o crescente e implacável avanço da ação desses oportunistas, ou como chamados civic ou lawtechs, foi assinado um Termo de Ajustamento de Conduta.
Com a participação das companhias aéreas, o SENACON, o MPDFT, e o MPF, esse TAC tem o objetivo de fazer uma regulação dos efeitos da pandemia do Covid-19 em relação aos clientes e as empresas LATAM, Gol, Azul, Passaredo e Map.
Por meio dessa TAC, foram propostas diversas regras, que visam regular de forma clara e legal os conflitos próximos que tiverem relação com esse evento que vivenciamos.
O documento traz várias definições que devem ser cumpridas e que têm relação com remarcações de voos, cancelamentos e todo o tipo de evento negativo que venha a acontecer, e que carregue relação com a pandemia atual.
Além disso, um dos grandes pontos de destaque do Termo, é o que deixa clara a vedação de se negociar ou mesmo ceder seus direitos de futuros créditos a esses aplicativos abutres oportunistas.
É possível ter acesso a essa informação por meio da leitura do parágrafo 4º da cláusula 2.1: “não é transferível, sendo proibida a negociação de tais direitos com terceiros, inclusive, mas não se limitando às empresas de tecnologia (lawtechs) que adquirem esses direitos de passageiros e promovem a Judicialização”.
Há um esforço conjunto das empresas aéreas e também do Governo, para deter a infestação por esses aplicativos abutres, que atuam de forma ilegal e em discordância do código de ética da OAB.
Para exemplificar, a OAB/RJ já promoveu uma ação civil pública contra essas lawtechs. Há toda uma convergência de opiniões no que tange a esse assunto, por isso, esperamos que haja um fim para esses aplicativos tão nocivos aos direitos do consumidor e para o próprio judiciário. É necessário urgentemente desjudicializar nossa economia, e resolver as contendas pela maneira apropriada.
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